Ninfomaníaca
Por Matthaus Ferrareli
Ninfomaníaca - Parte 1 é cercado de todos os lados por polêmica. A campanha de marketing e divulgação escolhida por Lars von Trier apesar de interessante, não deixa de ser chocante. O diretor ousou ao divulgar o filme com as expressões dos atores envolvidos na produção quando os mesmos atingem o climax. Só isso. O rosto de seus personagens expremidos e enrrugados pelo prazer e a baixo, o nome da obra. Dizer que a parte conservadora do mundo ficou receosa em entrar nas salas de cinema que exibiam o filme é apontar o óbvio. No entanto, apesar das polêmicas, o filme é mais leve do que se imagina, já que é basicamente um estudo de personagem recheado de divagações filosóficas que usa o sexo mais como vinhetas de passagem do que como centro narrativo, ao contrário do que se espera.
O filme foi escrito pelo próprio diretor, Lars von Trier, que já está bem marcado nas telonas por sua natureza depressiva e seus roteiros dramáticos. O filme tem início em um cenário marrom, uma cidade escura, em uma vizinhança solitária e melancólica (representação essa que é o quesito onde Lars mais se destaca), que disposta em becos estreitos nos apresenta a “Ninfomaníaca”. Nossa personagem principal. Joe (interpretada por Charlotte Gainsbourg) é encontrada inconsciente por um habitante local (personagem de Stellan Skasgard) e passa a relatar os eventos de sua vida que a levaram a se transformar numa mulher coberta de sangue e hematomas, sem nunca perder a oportunidade de deixar claro, desde o princípio, que não poupará a si mesma: “Eu sou um ser humano ruim”, afirma já de cara. Depois disso, pulamos para uma sessão de flashbacks e somos apresentados, de fato, à natureza da menina desde sua infância, até a fase adulta, quando começa a ser consumida pelo desejo sexual que habita seu corpo.
Filmes como esse são caracterizados como “episódicos” no âmbito crítico. Trata-se de empregar a conversa entre Joe e o pacato Seligman (Skarsgard) como âncora narrativa. Um lugar onde assossiações livres são capazes de levar-nos para frente ou para trás na linha do tempo - nos capítulos, se preferir - da vida de Joe. Por exemplo: uma conversação sobre a maestria que Bach possuia ao exibir uma perfeita polifonia em suas composições dá origem a um flashback sobre três amantes importantes da vida da garota. O curioso é que essas divagações acabam se tornando atrativos à parte, mesmo que usadas como meras transições. Da mesma forma, é interessante perceber que a narrativa não é um ser incorpóreo na mente de von Trier e este faz questão de comentar durante o filme a própria através de Seligman, ao apontar, por exemplo, que certa coincidência na história de Joe é implausível apenas para demonstrar que, para aproveitarmos a experiência integralmente, devemos aceitar todos os absurdos sem questionar a nossa narradora.
É bom notar quando é estabelecido o amor de Joe por seu pai (interpretado por Christian Slater com muito êxito), o prazer que ela sentia em sua companhia. Tudo isso denotado em cena quando Joe sente o vento refrescar seu rosto, estabelecendo que as relações físicas de prazer, oriundas de uma brisa, do formato de uma folha ou do sexo, não passam de experiências visserais de maior ou menor gozo. Lars von Trier também escolhe por não oferecer glamour excessivo ao sexo, nunca deixando que o êxtase do ato supere a calmaria da construção das circunstâncias que dão origem ao coito.
Pelo lado negativo, que sempre existe, Lars (diretor e roteirista desse longa) irrita em sua vontade de representar literalmente cada discussão entre Joe e Seligman, o que resulta em flashbacks dispensáveis (e francamente, entediantes). Estes “errinhos”, porém, não são o suficiente para anular momentos inspirados do longa ou mesmo a sensibilidade ao retratar uma mulher compulsiva pelo sexo não pelo prazer que o ato propicia, mas pela fuga que representa.
0 comentários:
Postar um comentário