O Tribunal Regional Eleitoral gaúcho (TRE/RS) negou provimento a representação patrocinada pelo escritório jurídico Sgorla & Cargnelutti, em nome do candidato Sanchotene Felice, que buscava amordaçar o Jornal CIDADE e obter direito de resposta à três matérias publicadas.
A ação
Citando as manchetes “Justiça acaba com trenzinho da alegria armado por Felice”, “Galeria do Santo Inácio: Schneider paga mais uma conta deixada por Felice” e “Barrados I e II”, o escritório jurídico acusou o Jornal CIDADE de ter montado um “verdadeiro bombardeio difamatório, com o fito exclusivo de atingir a campanha eleitoral dos autores (sic)”, e apresenta também outras matérias que visariam unicamente macular a imagem do Candidato. O Jornal CIDADE também é acusado de, em conluio com a atual administração municipal, difundir falsamente a situação de penúria na qual foi deixado o município pelo ex-mandatário, ora candidato Sanchotene Felice.
Utilizando apenas a matéria “Justiça acaba com trenzinho da alegria armado por Felice”, a banca de advogados tenta desqualificar a informação publicada atribuindo intenção clara de difamação, atribui a Felice a intenção de “estancar as incorporações a fim de estabilizar a folha de pagamento do município”, e, a par dos 194 pedidos de incorporação formulados por servidores, e sustenta que o suposto “beneficiamento de apaniguados” nunca existiu.
Além da frágil argumentação, o advogado ousou ir além do direito de resposta, e pediu liminarmente, que seja determinado ao jornal CIDADE se abster de citar o nome de Felice em qualquer matéria jornalística (jornal, rádio e site), até o dia das eleições, amordaçando a publicação para privar a comunidade uruguaianense de informação verdadeira sobre as atrocidades administrativas perpetradas pelo candidato que pleiteia um assento no parlamento gaúcho.
A defesa
Para defesa, o CIDADE contratou a Bermúdez & Bermúdez Advogados, tradicional banca local cujos titulares, inclusive, já dirigiram a publicação, e que prontamente sustentou a veracidade de todas as informações publicadas com o propósito de apenas informar a comunidade, e cujo teor é mera crítica à postura política adotada pelo mesmo que, como Prefeito da cidade, sancionou lei que prevê incorporação administrativa de valores a título de exercício de funções gratificadas a apenas 13 dias do término de seu mandato.
Combativa, a defesa diz ser absurdo censurar uma crítica política apenas pelo fato de ser contrária aos interesses do criticado, distinguindo esta de ofensas que poderiam denegrir a pessoa em seu foro íntimo, e desqualifica a especulação de Felice, de “montagem” de um verdadeiro bombardeio difamatório, atribuindo-a a sua imaginação. Segundo os advogados do CIDADE, Felice busca a volta da censura e do crime de opinião, inclusive de opiniões subentendidas por ele, sem contudo, haver qualquer inverdade a ser respondida, ou verdade a ser reestabelecida, e lembram que Felice, quando vem a Uruguaiana, usa de alguns meios de comunicação que privilegiou para ele sim, ofender tanto o atual Prefeito, como quem quer que dirija críticas aos resultados de sua administração, considerada nefasta por não poucos cidadãos.
Segundo os advogados, o Jornal CIDADE está protegido pelo exercício democrático e irrestrito da liberdade de Imprensa, e limitar a missão da Imprensa, que lhe incumbiu a própria sociedade, qual seja, o direito e ao mesmo tempo o dever de sempre se postar com o olhar mais atento, ou o foco mais acesso sobre o dia-a-dia do Estado e da sociedade civil, é uma heresia à Justiça, porque, nas palavras do ministro Ayres Britto, “ou ela é inteiramente livre, ou dela já não se pode cogitar senão como jogo de aparência jurídica”. A liberdade de informação, entendida por Albino Greco como “o direito de informar e de ser informado”, assevera tal proteção. Ademais, “a imprensa livre é o espelho intelectual no qual o povo se vê, e a visão de si mesmo é a primeira confissão de sabedoria”.
Por último, sustentaram os doutos que as matérias divulgadas versam sobre prática estritamente pública, política, e sua divulgação é sim, plenamente necessária, além de não possuírem caráter de atingir quem quer que seja, isto porque os fatos praticados na administração pública sujeitam-se à análise crítica de qualquer interessado. As informações privadas de Felice jamais foram objeto de matéria, até porque os repórteres do CIDADE não tem acesso a elas, que integram sua esfera íntima, repositório de seus segredos e particularidades de foro moral.
Em resumo, sustentou a defesa que não há de se falar em direito de resposta porque as matérias, primeiro, tratam unicamente de questões públicas, e segundo, porque tratam-se de declarações verídicas, jamais injuriosas ou difamatórias.
A decisão
A juíza Lusmary Turelly da Silva acolheu os argumentos de defesa, rechaçando o pedido de direito de resposta e a mordaça proposta por Felice. Com relação as matérias “Galeria do Santo Inácio – Schneider paga mais uma conta deixada por Felice”, e “Barrados I e II”, ela considerou que a afirmação genérica de ofensa e difamação, desacompanhada de argumentação e razões de fato e de direito que sustentem a pretensão, não tem força suficiente para conduzir a sua procedência, além de não haver no texto da resposta qualquer resposta ao que foi divulgado, senão pura propaganda eleitoral.
A única resposta de Felice às reportagens impugnadas é trazida em poucas linhas, e refere-se unicamente a matéria sobre o “trenzinho da alegria”, que na inicial cita como “exemplo de difamação”, e na resposta, como “um exemplo de reorganização administrativa”. Para a magistrada, uma vez que a Lei foi verdadeiramente sancionada no final de seu mandato, e ainda que a expressão “apaniguados políticos” traga crítica ácida e veemente, não há afirmação inverídica ou ofensiva que sustente um direito de resposta, estando dentro dos limites do questionamento político e administrativo.
A jurisprudência do TSE sobre o tema é assente no sentido de que não caracterizam ofensa à honra, nem ensejam direito de resposta, a opinião desfavorável referente ao desempenho de candidato por eventuais desvirtudes e equívocos; as críticas, mesmo que veementes, fazem parte do jogo eleitoral não ensejando, por si só, o direito de resposta, desde que não ultrapassem os limites do questionamento político nem descambem para o insulto pessoal nem para a increpação de conduta penalmente coibida.
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