O Plenário do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil decidiu, na segunda-feira (20/5), apoiar o Projeto de Emenda à Constituição 37, que reitera a exclusividade de competência policial na condução de inquéritos criminais. Por maioria de votos, os conselheiros da OAB confirmaram que irão a apoiar institucionalmente a PEC 37, por entender que é papel da entidade fazer frente à campanha do Ministério Público contra a aprovação do projeto. Entre os conselheiros, prevaleceu o entendimento de que a PEC é meramente declaratória, uma vez que a Constituição é clara em conceder ao Ministério Público apenas poderes auxiliares de investigação e de fiscalização da atividade policial. Porém, frente às distorções provocadas por um cenário de constante desprestígio do direito de defesa e de militância pelo protagonismo do MP, a entidade da advocacia brasileira deve intervir. Embora a OAB já houvesse proferido outras vezes pareceres contrários à tese de que o Ministério Público está autorizado a presidir inquéritos, o assunto voltou à discussão por meio de proposta do conselheiro federal pela seccional de Goiás Paulo Guedes de Medeiros. O relator da proposta, conselheiro Leonardo Accioly (PE), votou no sentido da OAB não se manifestar, uma vez que a discussão está superada, e a PEC, em si, incorre, segundo ele, em problemas técnicos. Para Accioly, o texto da PEC repete retrocessos”, como os que retiram os poderes auxiliares de investigação e fiscalização do Ministério Público, estes, sim, previstos na Constituição. No entanto, o conselheiro relator reconheceu que o Ministério Público vem cedendo a excessos midiáticos e arroubos corporativos, com a finalidade de defender a falsa prerrogativa de titularidade sobre inquéritos criminais. Accioly afirmou ainda que, para a opinião pública, os membros do MP passaram a ser heróis incorruptíveis e infalíveis.
Matéria superada
Foi um debate longo, desorganizado e interrompido diversas vezes para que o Conselho Federal tratasse de outros assuntos e recebesse autoridades para firmar convênios em meio à sessão plenária. Os próprios conselheiros promoveram um rosário de questões de ordem a fim de esclarecer sobre o que, afinal, estavam discutindo. O Plenário não conseguia chegar a um consenso sobre se estavam ou não reavaliando a posição da Ordem acerca do tema dos poderes de investigação do MP. Por fim, prevaleceu o entendimento de que a matéria era preclusa e que a discussão não deveria ser reaberta. O que cabia debater, portanto, era apenas se o Conselho Federal deveria ou não se manifestar em relação a PEC 37, uma vez que seccionais têm assumindo posições em sentido contrário. O relator acabou vencido no entendimento de que a Ordem não deveria apoiar institucionalmente a PEC 37, prevalecendo a divergência aberta pelo membro honorário do conselho, o ex-presidente do Conselho Federal da OAB Roberto Battochio, que fez um discurso inflamado sobre o tema.
Resolução arbitrária
Battochio abriu divergência afirmando que a Resolução 13 do Conselho Nacional do Ministério Público, responsável por estender a competência do MP em inquéritos, foi o que gerou a necessidade da PEC 37 tramitar no Congresso Nacional. Essa Resolução 13 do CNMP violenta a Constituição de República Federativa do Brasil, afirmou. Foi o avanço do Ministério Público nas atribuições institucionais previstas na Constituição, atribuídas à Polícia Judiciária, à Polícia Federal, escrevendo ainda leis processuais penais, reeditando o Código de Processo Penal a seu modo, que motivou a exigência dessa PEC 37, que é uma proposta de emenda constitucional meramente declaratória, afirmou. Battochio criticou ainda a tese dos poderes implícitos do Ministério Público para justificar a extensão de competência do órgão como titular de inquéritos. O ex-presidente da OAB disse que o Procedimento Investigatório Criminal (PIC), instituído por meio de resolução do Colégio de Procuradores de Justiça, em setembro de 2004, é uma norma bastarda, sem previsão no ordenamento jurídico e inconstitucional.
Antes de Battochio, o ex-presidente do Conselho Nacional da OAB, Cezar Britto, que não tem direito a voto, também afirmou que a Constituição é clara em atribuir ao MP apenas o poder de controle externo da autoridade policial. Desta forma, o órgão não poderia ter papel concorrente à polícia. Britto disse ainda que a Constituição divide as responsabilidades e atribuições para que ninguém seja dono do inquérito, que é um peça fundamental do equilibrio de nosso sistema jurídico.
Britto criticou a militância do MP no convencimento da opinião pública de que cabe principalmente ao órgão combater a impunidade. O bom, o honesto é o órgão acusador. O cidadão passou a ser culpado até se prove o contrário, disse Britto.
O conselheiro federal Guilherme Zagallo (MA) foi o único que se manifestou no sentido contrário em relação ao mérito da matéria. Zagallo afirmou que o sistema policial e de Justiça no Brasil é muito ruim e que a cada 100 ocorrências, apenas 11,5 tornam-se inquéritos policiais. Para o conselheiro, a Carta Magna não é tão clara quanto a estabelecer o papel do MP em investigações criminais, tanto que o Supremo Tribunal Federal parece ter dúvidas sobre o tema. O conselheiro citou como exemplo os votos de ministros em sentido contrário no Recurso Especial com Repercussão Geral que trata do assunto.
Mas coube, sobretudo, à bancada de São Paulo as manifestações mais contundentes e pontuais sobre a necessidade de a OAB apoiar institucionalmente a PEC 37. Os criminalistas Luiz Flávio Borges D’Urso e Guilherme Battochio (filho de Roberto) interromperam os colegas conselheiros repetidas vezes, com apartes técnicos sobre a natureza da PEC e a atuação do Ministério Público em inquéritos. Em alguns momentos, ficou evidente a impaciência de ambos os criminalistas com o desconhecimento de alguns dos conselheiros sobre aspectos envolvendo a matéria.
D’Urso afirmou que o Ministério Público se serve de uma colcha de retalhos de normas, com a finalidade de construir uma tese sem base jurídica e constitucional. Para o criminalista, embora a PEC reprise o óbvio , ainda assim é preciso apoiá-la pois, ao contrário do que o MP preconiza, trata-se apenas de uma disputa de poder e de espaço, disse. O MP antagoniza com a defesa porque Estado dividiu as atribuições. Conceder a ele poder de investigação é a subversão de um sistema que busca controlar a atuação do próprio Estado, afirmou D'Urso. Ao decidir por apoiar a PEC 37, o Conselho Federal da OAB também resolveu estabelecer uma Comissão de Acompanhamento e Aperfeiçoamento da proposta de emenda constitucional no âmbito do Congresso Nacional. Apenas as bancadas do Ceará, Maranhão e Pernambuco votaram a favor do Conselho Federal não se manifestar em relação à PEC no sentido da conclusão do relator.
0 comentários:
Postar um comentário